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Este vídeo sobre Contabilidade para Hospitais dá o contexto essencial da gestão financeira no setor de saúde — a base prática para você aproveitar ao máximo os benefícios fiscais que vamos detalhar agora.
O que são serviços hospitalares?
Serviços hospitalares são, de forma simples, os serviços de saúde típicos de um hospital – ou seja, aqueles diretamente ligados à promoção da saúde, que geralmente envolvem estruturas médico-hospitalares como centros cirúrgicos, internações, UTI, exames diagnósticos complexos e assim por diante. Em outras palavras, são os atendimentos de saúde que normalmente ocorrem em ambiente hospitalar ou equivalente, com uso de equipe médica e equipamentos especializados. Por exemplo, cirurgias, internações, exames de imagem (raios X, tomografias), procedimentos em ambulância UTI móvel e serviços de pronto-socorro se encaixam nesse conceito.
É importante destacar que nem todo serviço de saúde é considerado “serviço hospitalar” para fins tributários. A legislação e a Receita Federal entendem que consultas médicas simples em consultório não entram nessa categoria. Assim, um médico que apenas realiza consultas em seu consultório está prestando serviço de saúde, mas não um “serviço hospitalar” no sentido estrito da lei tributária. Os serviços hospitalares envolvem um nível de complexidade maior, normalmente exigindo instalações e processos próprios de hospitais ou clínicas equiparadas a hospitais.
Serviços próprios vs. serviços prestados a terceiros
Quando falamos em serviços hospitalares próprios, pensamos nos serviços prestados pelo hospital dentro de sua própria estrutura física, para seus próprios pacientes. Por exemplo, um hospital que realiza cirurgias em seu centro cirúrgico, com sua equipe e equipamentos, está prestando serviços hospitalares próprios.
Já os serviços hospitalares prestados a terceiros ocorrem quando a prestação do serviço envolve terceiros – seja utilizando a estrutura de outra entidade, seja atendendo pacientes de outra instituição. Alguns cenários comuns incluem:
- Uso de estrutura de terceiros: por exemplo, uma clínica ou médico que realiza cirurgias em um centro cirúrgico alugado de outro hospital (ou seja, o procedimento ocorre “na casa” de terceiros).
- Parcerias ou convênios: hospitais ou clínicas que prestam serviços para outras empresas de saúde. Por exemplo, um grande laboratório hospitalar que realiza exames para outras clínicas menores; ou um hospital que atende pacientes encaminhados por planos de saúde ou cooperativas médicas, utilizando sua estrutura para terceiros.
- Home care e unidades móveis: empresas de saúde que oferecem atendimento domiciliar ou via ambulâncias equipadas (UTIs móveis) para pacientes que não são “seus” pacientes internos, mas sim atendidos em nome de terceiros (como operadoras de saúde).
A dúvida comum dos gestores era: “Para ter o benefício fiscal dos serviços hospitalares, preciso ter um hospital próprio, com prédio e tudo?” Antigamente, a interpretação da Receita Federal era bem restritiva – exigia que a empresa tivesse instalações físicas nos moldes de um hospital para conceder a tributação favorecida, o que excluía, por exemplo, clínicas que usam centros cirúrgicos de terceiros ou atendimentos home care. Hoje, porém, isso mudou. Tanto os tribunais quanto a Receita já reconhecem que não é necessário possuir hospital próprio para ser considerado prestador de serviços hospitalares para fins tributários. O importante é a natureza do serviço e o cumprimento dos requisitos sanitários e empresariais.
Em resumo: se a sua clínica ou empresa de saúde presta serviços típicos de hospital, mesmo que em instalações de terceiros, você pode ser reconhecido como prestador de “serviços hospitalares” para fins tributários. O uso de um ambiente de terceiro (por exemplo, alugar uma sala cirúrgica em outro hospital) não impede a aplicação das alíquotas reduzidas, desde que esse ambiente esteja regularizado (alvará sanitário em dia), que os serviços tenham natureza hospitalar e que sua empresa esteja estruturada corretamente. Em outras palavras, você pode sim ter o benefício fiscal mesmo atuando em um hospital dia de terceiros ou realizando cirurgias em outro estabelecimento, desde que toda a operação atenda às normas de vigilância sanitária e você tenha uma empresa formalizada para isso.
Como funciona o Lucro Presumido (IRPJ e CSLL) para hospitais?
Para entender o benefício, precisamos primeiro lembrar como funciona o regime de Lucro Presumido na apuração do IRPJ (Imposto de Renda Pessoa Jurídica) e da CSLL (Contribuição Social sobre o Lucro). No Lucro Presumido, o governo presume (estima) um lucro com base no faturamento da empresa, ao invés de apurar o lucro real da atividade. Cada tipo de atividade tem um percentual de presunção, que é a porcentagem da receita bruta considerada lucro tributável.
- IRPJ: a alíquota básica é 15% sobre o lucro presumido. Adicionalmente, há um adicional de 10% sobre a parcela do lucro que exceder a R$ 60.000,00 por trimestre (detalhe que não precisamos aprofundar muito aqui).
- CSLL: a alíquota é 9% sobre o lucro presumido.
O ponto-chave é: qual é o percentual de presunção aplicado sobre a receita? Esse percentual varia conforme a atividade:
- Prestação de serviços em geral: A lei define que, em geral, empresas de serviços devem calcular o IRPJ sobre 32% da receita bruta. Ou seja, presume-se que 32% do faturamento é lucro tributável para IRPJ. Para a CSLL, normalmente também se aplica 32% como base presumida em serviços de natureza geral.
- Atividades comerciais/industriais: (Só para referência) usam percentuais menores, como 8% em vendas de produtos, 16% em transporte etc., mas isso foge do nosso foco aqui.
Agora, a legislação traz uma exceção importante para serviços hospitalares. Conforme o artigo 15 da Lei 9.249/1995 (alterado pela Lei 11.727/2008), se a empresa presta serviços hospitalares e atender a certos requisitos (falaremos deles adiante), o percentual de presunção do IRPJ cai de 32% para 8% da receita bruta. Ou seja, presume-se que só 8% do faturamento é lucro tributável (em vez de 32%). Para a CSLL, a mesma lei (art. 20) fixa 12% da receita como base presumida para serviços hospitalares qualificados, em vez dos usuais 32%.
Em resumo: para quem se enquadra como prestador de serviços hospitalares:
- IRPJ: 8% da receita bruta será considerada lucro (base de cálculo do imposto), ao invés de 32%.
- CSLL: 12% da receita bruta será considerada base de cálculo, ao invés de 32%.
Esses percentuais reduzidos representam um benefício fiscal muito significativo. A Receita Federal já esclareceu oficialmente que esses 8% (IRPJ) e 12% (CSLL) podem ser aplicados mesmo quando os serviços hospitalares são realizados em ambientes de terceiros, desde que todos os requisitos legais e sanitários estejam cumpridos. Ou seja, não há um “pedágio” maior só por usar estrutura de terceiro – cumprindo as condições, o percentual de presunção é 8%/12% mesmo assim.
Por outro lado, se a atividade não for considerada serviço hospitalar ou se os requisitos não forem atendidos, aí não tem exceção: aplica-se 32% mesmo. Então, qual é o percentual correto para serviços hospitalares prestados a terceiros? É 8% para IRPJ e 12% para CSLL, desde que sejam de fato “serviços hospitalares” nos termos da lei. Caso não se enquadrem, valem os 32% normais.
Vamos traduzir isso em números simples para ficar mais claro.
Exemplo prático de economia de imposto
Para visualizar a diferença, imagine uma empresa de saúde com R$100.000,00 de faturamento mensal em serviços:
- Se for tributada como serviço comum (32%):
- Base presumida IRPJ = R$32.000 (32% de 100 mil)
- IRPJ devido ≈ R$4.800 (15% sobre 32 mil; ignorando adicional para simplificar)
- Base presumida CSLL = R$32.000
- CSLL devida = R$2.880 (9% sobre 32 mil)
- Total IRPJ+CSLL: ~R$7.680 (cerca de 7,7% do faturamento vai só nesses dois tributos)
- Se puder usar a presunção reduzida de serviços hospitalares (8%/12%):
- Base presumida IRPJ = R$8.000 (8% de 100 mil)
- IRPJ devido ≈ R$1.200 (15% de 8 mil)
- Base presumida CSLL = R$12.000 (12% de 100 mil)
- CSLL devida = R$1.080 (9% de 12 mil)
- Total IRPJ+CSLL: ~R$2.280 (aprox. 2,3% do faturamento)
Nesse exemplo simples, a economia mensal de IRPJ+CSLL ao ser tratado como “serviço hospitalar” seria por volta de R$5.400,00. Em termos percentuais, equivale a reduzir a carga desses impostos de 7,7% para 2,3% da receita – uma diferença enorme para a margem do negócio.
Para um faturamento maior, o ganho cresce proporcionalmente. Por exemplo, um estudo simulou uma clínica com R$1.000.000,00 de receita mensal e concluiu que, com a tributação de serviço hospitalar, ela pagaria R$78.000,00 a menos em um único mês em tributos federais, representando 7,8% do faturamento de economia. Ou seja, o benefício fiscal pode significar sobreviver ou não no orçamento de um hospital ou clínica.
Observação: A redução aplica-se somente à parte do faturamento referente a serviços hospitalares qualificados. Se a empresa tiver outras receitas de serviços não enquadrados (como consultas comuns), essa parte continuará sofrendo tributação pela regra geral. Você deve calcular separadamente as receitas beneficiadas e não beneficiadas. A própria Lei 9.249/95 deixa claro que apenas a parcela da receita específica daqueles serviços hospitalares goza da base reduzida.
Quando o hospital pode usar a presunção reduzida (8%/12%)?
Nem todo hospital ou clínica pode simplesmente adotar os 8%/12%. É preciso cumprir algumas condições legais e operacionais. De forma didática, seu negócio precisa realmente parecer e funcionar como um hospital (mesmo que de pequeno porte), do ponto de vista jurídico e sanitário. Aqui estão os principais requisitos para ter direito à presunção reduzida:
- Ser sociedade empresária – Sua empresa deve estar constituída como uma sociedade empresária (por exemplo, uma Ltda. ou S/A registrada na Junta Comercial, com objeto empresarial de saúde). Não vale ser apenas profissional autônomo com CNPJ de sociedade uniprofissional ou sociedade simples. É necessário existir uma personalidade jurídica empresarial de fato e de direito. Isso garante que haja uma estrutura organizada além do trabalho pessoal dos sócios.
- Ter efetiva estrutura empresarial e elemento empresarial – Em outras palavras, ter uma organização de empresa de verdade. Isso significa possuir instalações, equipamentos, profissionais contratados ou cooperados, procedimentos administrativos etc., caracterizando que a atividade é empresarial e não apenas o exercício pessoal de uma profissão. Seu hospital ou clínica deve funcionar como uma empresa, não apenas como uma extensão da agenda de um médico.
- Cumprir integralmente as normas da Vigilância Sanitária (Anvisa) – A empresa precisa seguir todas as regras sanitárias aplicáveis a estabelecimentos assistenciais de saúde. Isso inclui ter licenças de funcionamento (alvará sanitário estadual/municipal), cumprir exigências de estrutura física, equipamentos de acordo com a Resolução RDC nº 50/2002 da Anvisa, dentre outras obrigações. Em resumo, estar regular do ponto de vista sanitário é indispensável.
- Alvará sanitário do local de atendimento – Se os serviços forem prestados nas suas instalações, seu estabelecimento precisa do alvará da vigilância sanitária. Se você presta serviços em ambientes de terceiros (por exemplo, usa o centro cirúrgico de um hospital parceiro), aquele ambiente também precisa ter alvará sanitário válido e apropriado para a atividade. Ou seja, não adianta atender num lugar sem licença sanitária esperando ter o benefício fiscal. A lei exige que o serviço seja prestado em ambiente devidamente regularizado.
- Natureza hospitalar do serviço prestado – Parece óbvio, mas é bom reforçar: os serviços realizados devem, de fato, ser de natureza hospitalar. Atividades tipicamente reconhecidas incluem: internações, cirurgias, serviços de emergência, UTI móvel, exames laboratoriais e de imagem de apoio diagnóstico, tratamentos terapêuticos que exigem estrutura clínica, entre outros. Inclusive, a Receita já explicitou que os serviços compreendidos nas atribuições 1 a 4 da RDC 50/2002 (que tratam de atendimentos ambulatoriais, de urgência, internação e apoio diagnóstico/terapia) estão dentro do conceito. Se você presta algum desses tipos de serviço e cumpre os demais requisitos acima, provavelmente tem direito à base reduzida.
Cumprindo todas essas condições, você pode aplicar a presunção de 8% (IRPJ) e 12% (CSLL) sobre a receita bruta mensal proveniente desses serviços hospitalares. Em outras palavras, seu lucro tributável será presumido em valor bem menor, reduzindo os impostos a pagar de forma legal.
Um exemplo de quem costuma preencher esses requisitos: clínicas médicas com centro cirúrgico ou hospital-dia, clínicas de imagem com equipamentos de alta complexidade, laboratórios integrados a hospitais, serviços de home care estruturados com equipes multidisciplinares e ambulâncias UTI móvel, etc. Além disso, hospitais maiores, obviamente, já se enquadram. O fundamental é que a operação tenha cara de serviço hospitalar, com toda documentação em ordem.
Vale notar também que mesmo sociedades cooperativas de saúde ou médicos cooperados podem se beneficiar, desde que a pessoa jurídica prestadora final seja uma sociedade empresária e os requisitos sejam atendidos. A Receita já afirmou, por exemplo, que uma clínica organizada como empresa que presta serviços via uma cooperativa médica ainda pode aplicar os 8%/12%, não perdendo o direito só por receber via cooperativa.
Quando não se pode usar a presunção reduzida (e exemplos do dia a dia)
Agora vamos aos casos em que não dá para usar a base reduzida de 8%/12%, porque ou a atividade não é considerada “serviço hospitalar” pelo fisco, ou algum requisito não foi atendido. Aqui estão algumas situações comuns do dia a dia em que o dono de hospital ou clínica precisa ficar atento:
- Consultórios médicos de consultas básicas: Como mencionado, consultas médicas simples não são consideradas serviços hospitalares para fins do benefício. Portanto, se a sua clínica apenas presta consultas ambulatoriais (por melhor que sejam), essa receita terá que ser tributada pelo percentual normal de 32%. Exemplo: uma clínica de clínica geral ou de pediatria que só faz consultas e pequenos procedimentos no consultório não pode aplicar 8%, pois consulta não se equipara a serviço hospitalar.
- Clínicas de estética ou procedimentos não relacionados à saúde essencial: Serviços de beleza ou estética que não visam tratar ou prevenir doenças não entram na definição de serviços hospitalares. Por exemplo, uma clínica dermatológica ou de estética que realize apenas aplicações de botox, peelings, depilação a laser, drenagem linfática, etc., não consegue o benefício, pois esses procedimentos são considerados de caráter estético, não diretamente voltados à promoção da saúde em ambiente hospitalar. Inclusive, há casos na justiça de clínicas assim que foram impedidas de usar a alíquota reduzida exatamente por não oferecerem serviços em caráter tipicamente hospitalar (apesar de possuírem médicos, a natureza dos procedimentos era estética).
- Empresa não constituída adequadamente: Se o hospital ou clínica está operando como sociedade simples ou apenas com profissionais autônomos, sem ser uma sociedade empresária registrada corretamente, não poderá usar a presunção reduzida. Esse é um erro de estruturação: muitos médicos abrem pessoa jurídica apenas para emitir notas, mas continuam como se fosse um “autônomo PJ”. Nesse modelo simplificado (às vezes optante pelo Simples Nacional, por exemplo), não há enquadramento como sociedade empresária, nem muitas vezes alvará sanitário próprio, então não se qualifica para os 8%/12%. A solução aqui seria reestruturar a empresa juridicamente para atender aos requisitos.
- Falta de licenças sanitárias e estrutura mínima: Se a clínica/hospital não possui alvará da vigilância sanitária ou não segue as normas técnicas de saúde, ela não só está em situação irregular sanitariamente (o que por si só já é um risco enorme), como também não pode usufruir do benefício fiscal. Um caso real: suponha que um laboratório de análises clínicas funcione sem licença sanitária válida – além do risco de interdição, tributariamente ele não teria como alegar que presta “serviço hospitalar” de forma regular. Da mesma forma, se falta uma estrutura mínima (por exemplo, uma clínica de endoscopia sem equipamentos adequados ou pessoal treinado), provavelmente não será reconhecida como serviço hospitalar.
- Receitas de serviços não hospitalares dentro da mesma empresa: Atenção se o seu hospital ou clínica realiza atividades mistas. Como dito, apenas a parcela da receita relativa aos serviços hospitalares qualificados ganha a base reduzida. Receitas de outras atividades permanecem com presunção normal. Então, se um hospital também aluga salas comerciais, ou se junto com cirurgias vende cosméticos na recepção, essas vendas e outras receitas não relacionadas à saúde hospitalar não podem ser tributadas com 8%/12%. Na prática, deve-se separar essas receitas e aplicar 32% nelas. Ignorar essa distinção é um erro que pode levar a autuação – o fisco pode cobrar a diferença de imposto dessas receitas indevidamente reduzidas.
Em resumo, não pode usar a presunção reduzida quem não cumprir todos os requisitos ou quem exerce atividades fora do escopo de serviços hospitalares. Os exemplos acima ilustram situações cotidianas: um simples consultório, uma clínica estética, uma empresa irregular – todas ficam de fora do benefício. Nesses casos, a tributação segue o Lucro Presumido “normal” (32% de presunção), ou dependendo do porte talvez o Simples Nacional (se for o caso), mas não o favorecimento de 8%.
Entendimento atual da Receita Federal e do STJ
A boa notícia para os empresários da saúde é que hoje há maior clareza e segurança jurídica sobre esse assunto do que anos atrás. Tanto a Receita Federal quanto a Justiça (STJ – Superior Tribunal de Justiça) já consolidaram entendimentos que ajudam a orientar os hospitais e clínicas.
Receita Federal: Nos últimos anos, a Receita veio alinhando seu entendimento ao dos tribunais. Em 2021, um parecer interno importante (Parecer SEI nº 7.689/2021/ME) foi emitido, e em 2024-2025 várias Soluções de Consulta foram publicadas no mesmo sentido. Em essência, a Receita reconheceu que:
- A expressão “serviços hospitalares” deve ser entendida de acordo com a natureza do serviço, e não obrigatoriamente pelo local físico. Ou seja, não exige hospital próprio, contanto que os serviços sejam prestados em ambientes devidamente licenciados e que a empresa seja uma sociedade empresária regular. Isso abriu as portas para clínicas e médicos que atuam em centros cirúrgicos de terceiros, clínicas de cirurgia ambulatorial (hospital-dia) e até serviços de home care serem enquadrados no benefício, desde que atendam os requisitos sanitários. A Receita explicitamente afirmou que utilizar ambientes de terceiros não impede a aplicação dos percentuais especiais de 8% e 12%.
- Reforçou os critérios que já detalhamos (sociedade empresária, elemento empresarial, normas Anvisa, alvará sanitário) como indispensáveis para qualquer um que queira a presunção reduzida. Somente cumprindo tudo é que a empresa pode usufruir da base menor. Isso serve de alerta: não adianta tentar “forçar a barra” sem ter estrutura; é preciso se encaixar nos parâmetros oficiais.
- A Receita também seguiu a linha de excluir consultas médicas simples do conceito de serviços hospitalares (mesmo entendimento do STJ). Então, esse ponto já não gera mais dúvidas: consulta isolada = 32% de presunção, e não 8%.
STJ (Tribunais): O Judiciário, especialmente o STJ, foi na verdade pioneiro em dar uma interpretação mais favorável aos contribuintes de saúde. Já em 2008 o STJ, em sede de recurso repetitivo (Tema 217), fixou uma tese que vem sendo aplicada consistentemente:
- Para ter direito às alíquotas reduzidas, o termo “serviços hospitalares” (na Lei 9.249/95) deve ser interpretado de forma objetiva, olhando para a atividade realizada. Consideram-se serviços hospitalares aqueles ligados às atividades desenvolvidas por hospitais, voltados diretamente à promoção da saúde. Importante: “em regra, mas não necessariamente, são prestados no interior do estabelecimento hospitalar”. Ou seja, o STJ deixou claro que não precisa ocorrer dentro de um hospital físico, se a natureza da atividade for hospitalar. E o tribunal explicitamente excluiu “simples consultas médicas” desse conceito, por serem típicas de consultório, não de hospital.
- Em palavras mais simples, o STJ disse: se a sua clínica faz algo que hospital faz (curar, tratar, operar, internar), então provavelmente é serviço hospitalar e pode ter o benefício. Se só faz consulta de consultório, não é. Essa definição do STJ é bastante ampla, limitando-se praticamente a tirar as consultas do jogo e algum outro serviço muito simples, mas abrangendo todo o resto (cirurgias, exames, terapias, etc.).
Essa posição judicial robusta deu respaldo para muitas empresas irem à justiça e ganharem o direito à tributação reduzida nos últimos anos. Com o tempo, a Receita deixou de recorrer e passou a aceitar essa interpretação – culminando nos pareceres e soluções que mencionamos. Hoje temos um cenário de convergência: a Receita Federal, via normas e consultas, e o STJ, via decisões reiteradas, estão alinhados. Ambos reconhecem o 8%/12% para serviços hospitalares num sentido amplo, desde que atendidos os requisitos legais.
Para o empresário, isso significa menos risco em adotar o benefício quando cabível, pois dificilmente será contestado se você realmente cumprir as regras. E significa também que, se no passado você não utilizou a presunção reduzida por medo ou desconhecimento, pode ser que tenha pago imposto a mais sem necessidade.
Orientações práticas para donos de hospitais e clínicas
Diante de tudo isso, o que um gestor de hospital, clínica ou laboratório deve fazer na prática para organizar sua tributação e aproveitar os benefícios sem cair em erros? Seguem algumas dicas em linguagem bem objetiva:
- Verifique a estrutura jurídica da sua empresa: Se você atua como pessoa física ou sociedade simples, avalie migrar para uma sociedade empresária (Ltda ou S/A). Essa formalização é primordial para ter acesso à equiparação hospitalar. Ajuste o contrato social, objeto social e registros necessários para deixar claro que é uma empresa prestadora de serviços de saúde com estrutura própria.
- Regularize e documente as condições sanitárias: Tenha todos os alvarás sanitários em dia, tanto da sua sede quanto de eventuais locais onde presta serviço. Siga as normas da Anvisa e da vigilância sanitária local à risca – desde estrutura física (instalações adequadas, equipamentos calibrados) até protocolos de saúde e segurança. Mantenha cópias desses documentos e atualizações, pois são sua comprovação de que você atende aos requisitos legais.
- Garanta a presença de um “elemento empresarial”: Tenha equipe e processos estruturados. Por exemplo, mantenha profissionais contratados (ou cooperados) com vínculo formal, tenha procedimentos operacionais padrão, registros de prontuários, sistemas de gestão. Isso mostra que a atividade é organizada de forma empresarial. Se for uma clínica pequena, invista em pelo menos um funcionário administrativo, organize sua agenda e faturamento como empresa, não deixe tudo informal. Esse “modus operandi” profissional ajuda a caracterizar o elemento empresarial indispensável.
- Identifique quais serviços do seu portfólio são hospitalares e quais não são: Faça uma lista dos serviços que sua instituição presta. Ao lado, marque quais se enquadram como serviços hospitalares (cirurgias, internações, exames complexos, etc.) e quais são atividades comuns (consultas, procedimentos estéticos simples, venda de produtos, etc.). Segregue contabilmente as receitas desses dois grupos. Na hora de calcular impostos, aplique os 8%/12% apenas sobre as receitas do primeiro grupo. As demais receitas continuam com 32%. Essa separação evita erros e aproveita ao máximo o benefício, dentro da lei.
- Evite tentar “forçar” atividades não enquadráveis: Às vezes a tentação de economizar imposto pode levar empresas a classificar tudo como serviço hospitalar. Seja cauteloso – consultas médicas continuam não sendo serviço hospitalar, procedimentos meramente estéticos também não. Não caia em soluções mirabolantes ou em “jeitinho” que não se sustentam. Baseie-se na legislação e nas definições oficiais para saber o que entra ou não. Em caso de dúvida, consulte especialistas.
- Mantenha registros e comprovações: Se você está tributando parte da receita a 8%/12%, esteja preparado para comprovar que eram serviços hospitalares de fato. Tenha prontuários, laudos, notas fiscais detalhadas, contratos de prestação de serviços, etc. Assim, se um dia a Receita questionar, você demonstra facilmente que, por exemplo, “R$ 50 mil foram de cirurgias X e Y realizadas em ambiente com alvará, com equipe tal” – evidências que sustentam o enquadramento.
- Fique de olho na Reforma Tributária e mudanças legais: O sistema tributário está passando por mudanças no Brasil. A partir de 2026, por exemplo, entrará em vigor a reforma dos impostos sobre consumo (IBS/CBS substituindo PIS, Cofins, ISS etc.). A saúde foi considerada setor essencial nessa reforma, e a lei complementar nº 214/2025 prevê uma redução de 60% na alíquota padrão do IBS/CBS para serviços de saúde. Em termos práticos, isso significa que os tributos sobre faturamento (como PIS/Cofins, que serão unificados) terão carga menor para hospitais e clínicas – estima-se uma alíquota efetiva combinada em torno de 10% ao invés de 25% nesses impostos sobre serviços de saúde. Essa é uma ótima notícia, pois reduzirá o custo tributário nas operações. Mas atenção: essa reforma incide sobre impostos de consumo (tributação sobre receitas), não altera diretamente o IRPJ/CSLL do Lucro Presumido. As regras de 8% e 12% discutidas aqui continuam válidas até segunda ordem. Entretanto, mudanças futuras podem vir (por exemplo, eventualmente uma reforma do Imposto de Renda). Por isso, mantenha-se informado com seu contador ou consultor tributário sobre novas leis que possam afetar o regime de Lucro Presumido ou benefícios para o setor de saúde. Tributação é um cenário dinâmico no Brasil – o que é vantagem hoje pode mudar amanhã, e vice-versa.
- Converse com um especialista tributário: A legislação tributária e suas interpretações podem ser complicadas para quem “não fala essa língua” diariamente. Considerando os valores em jogo, vale muito a pena buscar consultoria especializada para revisar a tributação do seu hospital ou clínica. Um bom contador ou advogado tributarista do setor de saúde saberá identificar se você está pagando imposto a mais ou correndo algum risco de pagar a menos sem perceber. Muitas clínicas descobriram, por exemplo, que vinham recolhendo IRPJ/CSLL como serviço comum (32%) sem precisar, e conseguiram reaver impostos dos últimos 5 anos ao provar que deveriam ter usado 8%/12%. Essa recuperação retroativa pode injetar um fôlego financeiro importante na empresa. Portanto, não hesite em procurar orientação profissional para garantir que você esteja no melhor enquadramento tributário possível, dentro da lei.
Por fim, lembre-se: tributação correta é parte da saúde financeira do negócio. No segmento de saúde, onde margens às vezes são apertadas e a responsabilidade é grande, aproveitar benefícios legais como a equiparação hospitalar pode ser a diferença entre fechar no azul ou no vermelho. Da mesma forma, errar na mão e usar um benefício indevidamente pode gerar uma dor de cabeça enorme com o fisco lá na frente (multas, autuações, retroativos). Então, informação e prevenção são as melhores aliadas.
Conclusão
Se sua empresa atende aos critérios, use sem medo o percentual reduzido para serviços hospitalares – é legal, incentivado e já consolidado pelas autoridades. E se não atende, não force: ajuste primeiro a casa para depois usufruir do benefício. Em caso de insegurança, busque auxílio especializado.
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